De acordo com a teoria tradicional personificada em Otto
Mayer seria inadmissível que os particulares fossem titulares de quaisquer
direitos subjectivos [poderes de vontade] face a uma autoridade pública. Segundo
esta concpeção o particular era objecto do poder administrativo e não sujeito de
quaisquer direitos, sendo que mesmo a realidade substantiva correspondia à
processual, pois o particular só ia a juízo para colaborar com a Administração
e nunca com o intuito de condenar o poder administrativo pela prática de
determinado ato.
A
incompatibilidade latente destas concepções dos inícios do séc. XX com o Estado
de Direito Democrático fez com que as correntes acima mencionadas fossem actualmente
abandonadas pela doutrina administrativista. Tem vindo a reconhecer-se a lógica
da relação jurídica, reconhecendo-se como pressuposto indubitável a
titularidade de direitos pela parte dos particulares.
Para além da
lógica relacional também o procedimento administrativo nasceu associado ao
Estado de Direito sendo que tem vindo a marcar o novo paradigma de entendimento
do direito administrativo obrigando a que se analise o entretanto e não apenas
a decisão final dos órgãos administrativos. É necessário ter em conta todo o
filme e não apenas a fotografia da decisão final. O procedimento como hoje o
concebemos, composto por quatro e já não por três fases é por um lado nova
fonte de legitimidade a dita “legitimação pelo procedimento” e, por outro,
fonte de eficácia. Com a participação dos particulares democratiza-se a atuação
administrativa e aumenta a probabilidade do particular vir a acatar a decisão
da administração.
Esta “pequena
grande revolução” do direito administrativo veio a reflectir-se no ordenamento
jurídico português em 1991, data em que no CPA se incluiu esta quarta fase do
procedimento. Entre a instrução e a decisão final da Administração inseriu-se a
audiência prévia dos interessados. A componente material do procedimento relaciona-se
com a necessidade que existe dos particulares interessados serem ouvidos,
necessidade esta que surge como imperativo associado ao paradigma da relação
jurídica administrativa. A consagração do direito de audiência prévia dos
particulares como fase obrigatória do procedimento administrativo surge como
uma garantia acrescida. Para além das exigências decorrentes do principio da
legalidade e de outros princípios fundamentais do poder administrativo como a
boa fé, igualdade, proporcionalidade etc. ao introduzir-se esta fase no
procedimento garante-se a participação dos particulares nas decisões que lhes
dizem respeito (veja-se a este respeito o regime dos arts. 100ss.CPA). Pode
parecer à primeira vista uma garantia vazia de conteúdo, pois a Administração
não está vinculada a decidir de acordo com a posição mais favorável para os
particulares, não obstante exige-se por esta via que haja ponderação e
transparência por parte da Administração, exige-se que decida conhecendo e
tomando em conta os interesses dos destinatários do ato em causa. Exigir-se que
a Administração decidisse sempre de acordo com a posição mais benéfica para o particular inviabilizaria toda a construção jurídica subjacente ao
direito público em geral, por conseguinte considero esta a modalidade mais
favorável ao reconhecimento do direito fundamental de participação dos
particulares no procedimento administrativo, tendo hoje mesmo reflexo a nível
processual (em Portugal desde a reforma do CPTA de 2002) com o reconhecimento do processo
administrativo enquanto um processo de partes, podendo também a outrora toda
poderosa Administração vir a ser condenada pelas suas actuações.
Beatriz Pereira da Silva
140112048
Beatriz Pereira da Silva
140112048
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