AS NOVAS “TENDÊNCIAS” DA ADMINISTRAÇÃO E UM CONFRONTO DE FASHIONISTAS
Nas últimas aulas, discutimos qual seria o centro do
Direito Administrativo, se é que havia algum centro. Decidi, pois, e na lógica
do pronto-a-vestir de que a Administração Pública hoje dispõe, comparar estas
novas “tendências” do Direito Administrativo com a Moda.
Inicialmente, e segundo a concepção
de Mayer, assiste-se a uma procura pelo centro da realidade administrativa. À
época, a Administração caracterizava-se por uma actuação agressiva e abrasiva,
sendo a lógica “actocêntrica”, ou seja, dependente do acto administrativo. A
mesma exercia o seu poder, declarando direitos e impondo-os coactivamente, numa
lógica autoritária, ligada aos traumas da infância difícil. Possuía, de igual forma,
uma série de privilégios, sendo o acto definitivo e executório. O particular
era um mero súbdito e não sujeito de direitos.
A este Direito Administrativo
“actocêntrico”, pensemos no estilo feminino antes dos anos 20, extremamente
rígido, ditado pelas socialites da
época, com pouca margem de originalidade.
Ora, com o Estado Social e com o
advento da Administração Prestadora, assistiu-se a uma crise nesta lógica “actocêntrica”,
deixando o acto administrativo de ter o a destaque de outrora. Ate aí uma realidade
incontestada, vai ter de ser repensada e reconstruida. Surgem novas formas de
actuação possíveis, para além do acto administrativo: os contratos públicos, os
regulamentos, os planos, entre tantos outros como a própria actuação informal e
técnica da Administração. Um autêntico pronto-a-vestir, segundo o Professor! O
acto já não é a única forma de actuação, uma “farda única”. Reflictamos, pois, as actuais
tendências de moda. Por um lado o boho
chic, o preppy, não nos
esquecendo de uma linha mais vintage
para quem a consegue concretizar. Não estamos limitados a um único estilo, mas
a vários. Cabe ao indivíduo escolher qual o que mais se adequa à sua própria
personalidade. E o mesmo se acontece quanto ao actual Direito Administrativo.
Além disso, o próprio acto administrativo
deixa de ser definitivo e executório, criando mesmo direitos face aos
particulares, que deixam de ser meros súbditos. Torna-se um acto multifacetado,
muitas vezes, de prestação de bens materiais, de satisfação de necessidades e não
susceptível de execução coactiva.
A lógica concorrencial acima
mencionada põe em causa a realidade “actocêntrica” do direito administrativo. O
acto administrativo seria, segundo Bahoff, uma fotografia instantânea de
relações em movimento, porém, seria, de igual forma, necessário ver o filme no
seu todo. Tal corresponde ao procedimento administrativo, processo de tomada de
decisões, mas também às relações jurídicas, que a Administração foi
constituindo desde que iniciou o procedimento até ao momento em que há relações
jurídicas duradouras.
Ora, uma nova questão emerge no
plano do Direito Administrativo, em plenos anos sessenta. Há, pois, duas formas
de conceber a própria dogmática administrativa: uma orientação italiana,
defendida por Nigro, Pericu, Cassesse, que faz do procedimento o centro do Direito
Administrativo e, por isso, tende a uma perspectiva de objectivação do mesmo,
baseada na própria organização administrativa; e uma orientação germânica que
se prende com a relação jurídica que precede o procedimento e que perdura para
além das decisões em concreto - uma realidade continuada e permanente.
Resume-se a uma maior subjectivação do Direito Administrativo (a chamada teoria
comportamentalística-racional de Schmitt-Glaser e de Luehmann ou simplesmente
teoria da decisão).
Segundo o Professor Vasco Pereira da
Silva, “a teoria da decisão germânica
considera o procedimento como condicionante da decisão final, mas não descura a
relevância desta última a doutrina italiana preocupa-se mais com a
evolução da actuação administrativa do
que com o seu resultado, pouco ou nada ligando a este” (in Em Busca do Direito
Administrativo Perdido).
Assim, a doutrina alemã, baseando-se
na relação jurídica dos particulares com a própria Administração, engloba
relações procedimentais, processuais, subjectivas; concretizando-se numa maior
amplitude que a perspectiva italiana que apenas se foca na lógica
procedimental.
Aqui, relacionemos duas tendências
actuais no mundo da moda, que são personificadas por fashionistas como Cara Delevingne e Olivia Palermo. Enquanto a
primeira prima por um estilo descontraído e jovial, a última caracteriza-se por
um estilo muito feminino, não descurando os acessórios e pensando no mais
pequeno pormenor. Se perguntarmos qual a orientação central da moda hoje em
dia? A doutrina diverge… Olivia ou Cara? O procedimento ou a relação
jurídica?
Olivia Palermo |
A verdade é que não podemos olhar para estes
confrontos e consequente bipolaridade de realidades (quer administrativas, quer
de fashion trends!) como antagónicas.
Pelo contrário, tendem a aproximar-se, já que ambas as realidades não são apenas
conciliáveis como devem coexistir. De facto, o procedimento é uma realidade que
é composta por relações jurídicas substantivas, e também é um facto que tanto o
estilo de Olivia e de Cara se complementam além de provir dos mesmos estilistas
e maisons de haute couture.
O
Professor Vasco Pereira da Silva entende que lógica alemã é mais adequada para
explicar o ordenamento jurídico moderno, bem como a realidade portuguesa
(atente ao artigo 212 da CRP
que refere o conceito de relação jurídica) já que é mais abrangente.
Mas, fará ainda sentido encontrar um centro
para o direito administrativo, vulgo para a moda? Aqui, restam dúvidas,
motivadas por outras realidades que se transformaram no quadro administrativo.
Note-se, a característica da actual multilateralidade das relações jurídicas,
ao invés da inicial bilateralidade, consubstanciando-se num alargamento da actuação
administrativa, consequência do alargamento dos direitos fundamentais: a
chamada terceira geração de direitos, ligados ao consumo, saúde e ao ambiente. Assim, nos dias
de hoje, a relação jurídica
é concretizada através de uma multiplicidade de entidades, que aumentam, quanto
maior for a decisão em causa. O procedimento é agora de massas. Cara, Olivia,..
O que interessa? Visto-me como quero e sigo as tendências de quem eu quero. A
moda é feita por mim, é feita por todos nós. Tanto o Direito Administrativo
como a Moda reflectem tal ideia: a liberdade de escolha perante a
multiplicidade de “tendências”.
Filipa Bernardes Vilela
140112061
Sem comentários:
Enviar um comentário