sexta-feira, 25 de abril de 2014

Rota Procedimental - Breve viagem ao imo do Procedimento Administrativo

A atividade administrativa não se esgota na tomada de decisões já que existe sempre um conjunto de vários atos preparatórios a praticar antes da tomada da decisão, como por exemplo: estudos, averiguações, vistorias, pareceres… e outros tantos trâmites a percorrer depois dela, como registos, vistos, notificação aos interessados, entre outros.

O procedimento administrativo permite que os seus intervenientes, particulares e autoridades administrativas determinem um certo resultado. É um procedimento em que o “administrado” e o administrador se põem de acordo em relação a interesses que são simultaneamente públicos e privados.
O que caracteriza a atividade administrativa é o próprio desenvolvimento do procedimento qualquer que seja o seu ato. É ele que regula o atuar administrativo anterior e posterior à decisão final. 

A dogmática tradicional via o procedimento administrativo como uma sequência lógica e necessária em que apenas o objeto da decisão final, ou seja, o ato era realçado.
Hoje, o procedimento “destruiu praticamente o ato, reduzindo-o a um mero resumo dos elementos pré formados no decurso do procedimento” (nas palavras de Schimitt Glaeser). Aceitar isto implica, segundo o Professor Vasco Pereira da Silva:
·                    A uniformização do tratamento dogmático de toda a atividade administrativa. – “é o procedimento que faz a ponte entre a atuação de gestão pública e privada” ;
·                    Possibilidade de constituir e manter uma relação duradoura entre a Administração Pública e os particulares.

O procedimento não pode ser considerado como uma sequência fixa de ações determinadas. Adotar esta opinião seria aceitar que para cada caso, existiria uma única ação a ser tomada (ação estereotipada), o que excluiria a possibilidade de escolha nas ações a adotar, independentemente das consequências fáticas daquela ação para aquele caso em particular.
Tal realidade não se pode hoje aceitar, antes pelo contrário. No procedimento administrativo todos os interesses, direta ou indiretamente relacionados com a decisão final, devem ser tidos em consideração.

-Qual a sua razão de ser?
Os grandes objetivos da regulamentação jurídica do procedimento administrativo são, essencialmente, garantir uma defesa contra os poderes arbitrários da Administração Pública, salvaguardando desta forma os direitos subjetivos e os interesses legítimos dos particulares, bem como assegurar o princípio da eficiência, através de uma racionalização de meios a utilizar pelos serviços da Administração Pública.
Racionalizar o procedimento é também uma maneira de melhorar a qualidade da decisão, já que este visa conciliar o interesse público com os interesses dos particulares enquanto cidadãos.

- Qual a sua relevância?
Enquanto o Direito Administrativo clássico via o procedimento em razão dos resultados a que se podia chegar (visão atocêntrica) hoje, o procedimento vale por si mesmo, enquanto instrumento de correção e de eficácia das decisões administrativas, bem como de garantia de proteção antecipada dos direitos dos particulares, estabelecendo-se uma relação duradoura entre as partes envolvidas devendo, por isso, ser participativos.
O procedimento permite, deste modo, que sejam os intervenientes do processo a determinar o seu próprio resultado.


-Qual a sua natureza jurídica?
O n.º 1 do artigo 1º do CPA, define o procedimento administrativo como sendo a sequência juridicamente ordenada de atos e formalidades tendentes à preparação da prática de um ato da Administração ou à sua execução. Desta forma, pode retirar-se que o procedimento não se confunde com o processo administrativo. Este último enunciado no n.º 2 do mesmo artigo 1º do CPA, como sendo o conjunto de documentos em que se traduzem os atos e formalidades que integram o procedimento.
Assim, conclui-se que a cada função do Estado corresponde uma modalidade de procedimento diferente. Conforme diz o Professor Vasco Pereira da Silva no seu livro, Em busca do ato administrativo perdido, “não é o procedimento administrativo que é um processo especial, mas sim o processo que é o procedimento especial da função judicial.”
Apesar de nas palavras do Professor Freitas do Amaral existirem, neste ponto, “teses opostas”, fase à distinção acima enunciada entre processo e procedimento, a verdade é que, e seguindo a orientação do Professor Vasco Pereira da Silva, deve ser hoje adotada uma “Tese anti processualista” (conforme é apelidada pelo Professor Freitas do Amaral). Segundo esta tese, o procedimento não é um processo, dado que procedimento administrativo e processo judicial são duas realidades distintas e irredutíveis.


-Quais os seus princípios fundamentais do procedimento administrativo?
Este obedece a um conjunto de princípios fundamentais, entre os quais:

·                    Ter caráter escrito
Como observava Marcelo Caetano “o modo de funcionamento da administração não se compadece com a oralidade”.
A redução a escrito tem a finalidade de conservar o registo completo e seguro do que se fez e/ou disse. Sendo que atualmente o papel está a dar lugar à informação guardada em suporte informático (teoria dos dois degraus – porquanto com a informatização, o nível técnico e jurídico da Administração encontram-se ligadas).

·                    Simplificação do formalismo
Ao contrário do processo judicial que continua a ser sujeito a um formalismo rígido, o procedimento administrativo é, ou deve ser, menos formal e mais maleável, competindo à Administração conduzir o procedimento do princípio ao fim pelas formas mais adequadas, mas sempre respeitando as normas legais e constitucionais.

·                    Natureza inquisitória
A administração Pública é ativa, gozando do direto de iniciativa para promover a satisfação do interesse público, conforme se retira do artigo 56.º CPA: “Os órgãos administrativos, mesmo que o procedimento seja instaurado por iniciativa dos interessados, podem proceder às diligências que considerem convenientes para a instrução, ainda que sobre matérias não mencionadas nos requerimentos ou nas respostas dos interessados, e decidir coisa diferente ou mais ampla do que a pedida, quando o interesse público assim o exigir.”

·                    Colaboração da Administração com os particulares
Consagrado no n.º1 do artigo 7.º CPA.

·                    Direito à informação dos particulares
Consagrado no n.º1 do artigo 268º CRP e nos artigos 61º a 64º CPA.
No entanto, a matéria relativa ao direito à informação não procedimental está regulada pela Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto (prevê a possibilidade de acesso aos documentos administrativos e à sua reutilização).
Em matéria relativa a questões ambientais rege a Lei n.º19/2006, de 12 de Junho, que regula o acesso à informação ambiental.

·                    Participação dos particulares na formação das decisões que lhes digam respeito
Princípio este consagrado no n.º 5 do artigo 267.º CRP, que estabelece que o processamento da atividade administrativa assegurará a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito, conjugado com o artigo 8.º do CPA.
Acresce ainda dizer, que no âmbito deste princípio, hoje um dos fundamentos da decisão administrativa é a audiência dos interessados, direito este pertencente à 3ª geração de direitos fundamentais, em consequência do Estado Pós-Social em que vivemos atualmente (opinião esta contrária, no entanto, à do Professor Freitas do Amaral).

·                    Princípio da decisão
Este principio encontra a sua base legal no artigo 9º CPA, e tem um duplo objetivo:
- a Administração deve pronunciar-se sempre que lhe seja solicitada pelos particulares;
-o de facilitar a sua proteção face às omissões administrativas ilegais, garantindo o direito de reagir em tribunal contra a passividade administrativa de um dever legal de decidir.

·                    Princípio da desburocratização e da eficiência
Princípio consagrado no artigo 10.º CPA, segundo o qual “a Administração Pública deve ser estruturada de modo a aproximar os serviços das populações e de forma não burocratizada, a fim de assegurar a celeridade, a economia e a eficiência das suas decisões.” Este princípio implica que a Administração Pública deve organizar-se de modo a fazer uma utilização racional dos meios ao seu dispor, simplificando ao máximo quer as suas operações próprias bem como o relacionamento com os particulares.
Nas palavras do Professor Freitas do Amaral, este princípio revela-se difícil de concretizar por implicar uma renovação permanente nas estruturas e métodos de funcionamento da Administração Pública.

·                    Princípio da gratuitidade
Previsto no artigo 11.º CPA, o qual estabelece que “o procedimento administrativo é gratuito, salvo na parte em que leis especiais impuserem o pagamento de taxas ou de despesas efetuadas pela Administração.” Este artigo prevê ainda que em cada de insuficiência económica, sobre o apoio judiciário, “a Administração isentará, total ou parcialmente, o interessado do pagamento das taxas ou das despesas”.

·                    Princípio do acesso à justiça
Este principio tem a sua sede legal no artigo 12.º CPA, sendo que prevê que aos particulares sejagarantido o acesso à justiça administrativa, a fim de obterem a fiscalização contenciosa dos atos da Administração, bem como para tutela dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, nos termos previstos na legislação reguladora do contencioso administrativo”.

Para além dos princípios referidos existem ainda outros, como o princípio da legalidade, boa-fé, imparcialidade, justiça, igualdade, proporcionalidade, entre outros.


-Qual a importância da participação dos cidadãos no procedimento?
A participação do particular no procedimento administrativo é analisada não como mero meio de defesa nas suas posições subjetivas perante a Administração, mas também como um expediente organizativo destinado à tomada das melhores decisões administrativas resultantes da cooperação entre a Administração e os particulares.
Para além disso, torna-se evidente que se os particulares participarem no processo decisório, torna-se mais fácil estes aceitarem a decisão da Administração.
Conclui-se por isso que a atuação duma Administração num Estado Social de Direito Democrático tem ser baseada numa participação ativa pelos particulares, dado que cada vez mais, com o desenvolvimento das relações jurídicas multilaterais, as decisões da Administração acarretam consequências na esfera jurídica duma pluralidade de particulares.



Os procedimentos juridicamente organizados fazem parte dos atributos mais extraordinários do sistema político das sociedades modernas”, Niklas Luhmann.



Rita Nobre
(n.º 140112032)

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