terça-feira, 13 de maio de 2014

Âmbito da Revisão CPA - pesquisa e opinião critica


 Revogação de actos válidos constitutivos de direitos, ''as vozes que se levantam ''

  Em consequência de uma proposta que o Governo apresentou a um grupo de trabalho chefiado pelo Professor Fausto Quadros como também das reformas de Estado que o Governo está a empreender, em 14 de Maio de 2013, Paula Teixeira da Cruz, Ministra da Justiça, apresentou publicamente o projecto de revisão do Código de Procedimento administrativo. Donde, entre as principais alterações propostas, se podem destacar: 


  • O alargamento da sua aplicação às entidades administrativas independentes - como os reguladores - bem como a todos os organismos que exercerem poderes administrativos de autoridade;
  • Coincidência dos princípios gerais da actividade administrativa com os pilares da sua actuação junto dos cidadãos. Aqui, realçam-se os princípios da responsabilidade, da segurança de dados e de colaboração com a União Europeia. Quanto aos princípios já existentes, reforçam-se os princípios da boa administração, da justiça, da razoabilidade e da boa-fé, com o objectivo de instituir uma Administração justa, isenta, transparente, célere, eficiente e mais participada;
  • Reforço de impedimentos, escusa e suspeição, e sanções para as decisões da Administração Pública que violem a imparcialidade;
  • Revogação dos actos administrativos válidos constitutivos de direitos pela Administração caso haja alteração objectiva das circunstâncias, embora sob pagamento de uma indemnização aos seus titulares.



   Focar-me-ei no aspecto da revogação dos actos administrativos válidos constitutivos de direitos, que a meu ver é das questões que mais ''vozes'' levanta na doutrina e jurisprudência portuguesas. Ora, vejamos alguns comentários:


  Professor Paulo Otero - Caracterizando os tempos que correm como sendo Portugal, de momento, um Estado Sujeito a um protetorado internacional que assiste ao retrocesso jusfundamentale a um reforço da Administração agressiva, o professor Paulo Otero faz variadas criticas aos tópicos em discussão para a alteração do nosso CPA. Por ora, importa salientar a opinião do professor em relação à possibilidade de revogação de actos administrativos válidos constitutivos de direito, e quanto a este aspecto, alerta para o facto de, na sua opinião a revogação destes actos se mostrar ilustrativa de um imenso retrocesso de direitos. E, após alguns tópicos a titulo exemplificativo, critica negativamente os regimes da revogação e anulação, afirmando que, verdadeiramente o que o CPA estará a fazer com este regime  vai conduzir: à precarização de todos os acto constitutivos de direitos ao sujeitá-los à revogabilidade por alteração das circunstâncias e superveniência de conhecimentos técnico científicos; dificultar a consolidação na ordem jurídica dos actos anuláveis, considerando que o decurso de um ano após a sua prática não lhe confere qualquer garantia de intagibilidade; e, finalmente, expressa, numa linguagem que transmite preocupação ao leitor (pelo menos no meu ponto de vista), que «o mais grave de todo este regime de retrocesso das garantias dos cidadãos » que se traduz num gesto de desprezo pela segurança e tutela da confiança «além de se aplicar aos futuros actos administrativos, é também aplicável aos actos administrativos que, ..., ainda hoje produzem efeitos». 

 Ordem dos Advogados - « Não se afigura que a alteração das circunstâncias ou a superveniênca de conhecimentos técnicos e científicos em face dos quais eles não poderiam ter sido praticados constituam motivos legítimos e constitucionalmente válidos para a revogação de actos constitutivos de direitos válidos e consolidados, de forma definitiva, pois isso corresponde a dar o dito por não dito (...). E põe em causa os princípios da confiança e da segurança jurídicas que estão insitos e constituem colorários do Princípio do Estado de Direito, consagrado no art. 2º da Constituição. » in, Vida Judiciária. 

 Professor Doutor Jorge Bacelar Gouveia - « Considera que os operadores judiciários, nomeadamente juízes e advogados, não estão preparados para esta reforma do CPA, na medida em que os mesmos não foram ouvidos sobre esta mesma matéria, para além de se tratar de uma reforma que partiu erradamente de uma perspectiva normativista. » in, Vida Judiciária.

 Professor Freitas do Amaral - Ao responder à questão de saber de, neste projecto, se trata de um novo CPA ou apenas uma revisão, o professor considerou que, se o privilégio de execução prévia não de mantiver, então tratar-se-à de um novo código, clarificando que na sua opinião ''não será um bom código''. in Colóquio do Procedimento Administrativo de 25 de Junho de 2013 (Universidade Católica Editora). 

 Professor Doutor Vasco Pereira da Silva - Atendo à actualidade e à aceleração da vida moderna, considera que é necessário estabelecer mecanismos que permitam à administração revogar os seus actos e que tutelem a confiança do particular, permitindo que essa revogação seja possível quando haja circunstâncias anormais. Salientando também que a importância da permissão dessa revogação decorre da existência de normas demasiado rígidas que se encontram no nosso código.  

 Após a análise das perspectivas dos vários autores, cabe a mim comentar: 

Do ponto e vista clássico, a estabilidade era levada às últimas consequências, afirmando-se a existência de um prazo de um ano, dentro do qual os actos ilegais podem ser revogados, e que para além desse prazo, o particular devia poder contar com a palavra da Administração, e deste modo, ficaria esta impedida de revogar. 

 Mas esta ideia tem vindo a entrar em crise em razão da rapidez e aceleração da vida moderna, e existe a necessidade de tomar medidas rápidas para resolver os problemas que se têm vindo a sentir. E se o mecanismo da revogação se destina a que a administração vá prosseguindo, não apenas o interesse público mas também o interesse do particular, não faz sentido que o processo de revogação seja tão restrito e dificultado. Ao invés, este regime deveria ser facilitado de modo a que a revogação seja admitida com a maior amplitude possível, pois é este o caminho que deve ser apontado para a melhor prossecução dos seus princípios, quer o da boa administração quer o da legalidade. 

 Mais, se se fala de uma fuga para o direito privado, então devemos olhar conjuntamente para os particulares e para o interesse público, e pensando nos princípios da boa-fé e protecção da confiança, ao lado também do direito de audiência consagrado no nosso CPA, não será de admitir que a revogação de actos válidos constitutivos de direitos é o caminho a seguir para a prossecução dos interesses e também para uma relação de harmonia entre o cidadão português e a Administração Pública? A própria ministra da justiça, Paula Teixeira da Cruz, apelou a essa relação harmoniosa. 

 Na minha opinião, é mais que claro que se deve atender e respeitar o princípio da estabilidade, contudo não deve ser levado ao extremo. Ao contrário das opiniões maioritárias de discordância perante esta alteração de regime, a meu ver erróneas, penso que este regime de revogação para actos válidos constitutivos de direitos é benéfico e propício à prossecução dos vários princípios administrativos, a uma relação harmoniosa entre cidadão e administração e também à tutela dos interesses públicos e particulares. Chamo à atenção também para o facto de que, se interpretarmos o direito de audiência num sentido amplo, não será de atender a uma concepção de um direito de audiência não só '' pré-acto '', mas também ''pós-acto ''? Não me cabe a mim o julgamento final, apenas achei relevante pensar em que medida é que levar ao extremo o princípio da estabilidade não poderá por em causa interesses legítimos ou até mesmo outros princípios administrativos. 

 Finalmente, gostaria de evidenciar que entendo em que medida é que o professor Paulo Otero conseguiu considerar a flexibilização deste regime como o regresso de uma administração agressiva. Contudo, não consigo concordar com a sua opinião na medida em que entendo que a administração agressiva actuava apenas para pôr em causa os direitos dos cidadãos, e quanto a este caso essa actuação, apesar de poder pôr em causa a tutela da confiança em alguma medida, vale maioritariamente para a prossecução de interesses legítimos. 


Beatriz Pereira Valério Jorge Pimenta 
Número: 140112049 




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