Embora
as suas raízes remontem ao direito romano, a ideia da associação do particular
à realização do interesse publico só se desenvolveu verdadeiramente a partir do
século XIX , em França, tendo-se expandido a partir daí a países vizinhos, em
especial naqueles em que vigora o sistema de tipo Francês.
No
entanto, na Alemanha e Itália a figura do contrato administrativo encontrou uma
enorme resistência (hoje já ultrapassada). Para Otto Mayer, por exemplo, a
figura do contrato era incompatível com a essência do direito público
nomeadamente por três razões:
1. Sendo
o Estado soberano não pode este ficar vinculado a um particular por contrato
2. A
figura do contrato implicava igualdade entre as partes
3. Por
quanto existia uma figura jurídica especifica do direito publico, mas
essencialmente diversa do contrato característico do direito privado. Para
estes autores, o contrato público consistiria no conjunto de dois atos
unilaterais: um ato administrativo unilateral por parte da administração e um
ato jurídico unilateral de direito privado.
Por
outro lado, os partidários da admissibilidade do contrato no âmbito do direito
público afirmavam que:
1. Nem toda a administração pública é o Estado.
2. O Estado quando atua no âmbito do direito
administrativo, não age como estado soberano mas sim como estado administração.
3. Atendendo à teoria dos atos administrativos
constitutivos de direitos e de interesses legalmente protegidos o Estado pode
ficar vinculado perante os particulares por meio de um ato unilateral, assim
por maioria de razão este poderá vincular-se perante os particulares por ato
unilateral (contrato).
Hoje,
no entanto, há que ponderar que no contrato administrativo o Estado não se
demite da sua autoridade a administração vincula-se perante os particulares nos
termos da lei, fazendo parte desta a manutenção de certos poderes relativamente
aos particulares. Assim sendo, conclui-se que o contrato administrativo não é
um contrato baseado na igualdade entre as partes (o melhor exemplo disto são as
cláusulas contratuais gerais).
Contudo
a modificação das cláusulas contratuais só pode ocorrer por comum acordo e não
por imposição unilateral de uma das partes. No entanto, existem situações em
que a resolução se justifica plenamente. Por exemplo em caso de haver uma
alteração anormal e imprevisível das circunstâncias, o contraente publico tem o
direito de resolver o contrato.
O
contrato administrativo é uma das atuações administrativas que tem vindo a
adquirir uma importância crescente, em especial a partir do fim da primeira
metade do século XX, devido à complexificação e importância da Administração no
Estado Social de Direito. Assim, a administração passou a procurar cada vez
mais a colaboração de particulares para prosseguir fins de interesse púbico
(conforme impõe o n.º 1 do art.º 266.º CRP).
Contudo,
a sua utilização generalizada levou certas questões na doutrina. Por um lado a
questão de saber se os contratos contratualizados pela administração e pelos
particulares são iguais ou se obedecem a especificidade distintas dada a
diferença da natureza dos seus intervenientes.
A
doutrina tradicional assentava na ideia de que os contratos administrativos
teriam sido subtraídos à competência dos tribunais comuns e colocados sobre a
alçada dos Tribunais Administrativos devido à sua diferente e especial natureza
que os distinguia dos contratos privados.
Assim,
tornava-se essencial procurar o critério de distinção que permitisse fazer a
distinção entre contratos administrativos e contratos de direito privado da
administração. Apesar de terem
sido vários os critérios usados pela doutrina para identificar essa distinção,
hoje não há nenhum critério que por si só o possa fazer, havendo ainda quem
defenda que o problema não se chega a colocar por tal distinção nem sequer
existir, já que todos os contratos da administração são contratos
administrativos e só em situações excecionais a administração celebra contratos
privados, sendo esta a opinião defendida pelo Professor Marcelo Rebelo de Sousa
e pela Professora Maria João Estorninho.
A
partir da década de 70, começaram a surgir as primeiras diretivas comunitárias
sobre contratação pública, o que se explica pelo desejo de concretização das
quatro liberdades europeias (liberdade de circulação de capitais, serviços,
mercadorias e trabalhadores). A necessidade de regular o problema da
contratação pública deve-se ao facto do montante económico que a maioria dos
contratos da Administração envolve não ser acessível à maioria dos
particulares, sendo que a grande maioria dos contratos públicos tem um grande
impacto na economia não só de cada Estado, como na da União Europeia.
As
diretivas da União Europeia vieram, por um lado, regular certos contratos (como
o contrato de empreitada de obras publicas, contrato de locação de bens móveis,
contrato de aquisição de serviços, contrato de concepção de obras públicas) e
por outro estabelecer que em determinadas áreas, todos os contratos deveriam
ser contratos administrativo (como por exemplo os contratos celebrados na área
da energia, ambiente, transportes, telecomunicações …) como é o caso do Decreto-Lei
n.º 223/2001, de 9 de agosto.
O surgimento do Código dos Contratos
Públicos
(em especial o desenvolvimento do regime jurídico das empreitadas de
obras públicas)
Antes
de chegarmos ao momento em que hoje nos encontramos, com a sistematização dos
diversos preceitos legais relativos aos contratos públicos, vários foram os
caminhos a percorrer até à elaboração do Código dos Contratos Públicos – CCP,
de 2008.
Até
ao decreto de 9 de Maio de 1906, as empreitadas e os fornecimentos de obras
públicas eram apenas regulados pelas cláusulas e condições gerais publicadas a
28 de abril de 1887 e pelas instruções de 18 de julho do mesmo ano. O referido
decreto, de 1906, aprovou as cláusulas e condições gerais de empreitadas e
fornecimentos de obras públicas que constituíam a disciplina base das
empreitadas de obras públicas.
Entretanto,
a portaria n.º 7702 de 24 de outubro de 1933 veio publicar as novas regras para
a arrematação e adjudicação de obras públicas bem como das respetivas liquidações,
seguidamente, o decreto n.º 4667, de 14 de junho de 1918, veio aprovar o
regulamento para a execução e contabilidade dos serviços de obras públicas, em
substituição do regulamento aprovado por decreto de 10 de Maio de 1907.
O
regime contido nestes diplomas constituía a disciplina fundamental para a
adjudicação, celebração dos contratos, execução e contabilidade das empreitadas
e fornecimentos de obras públicas, sendo ainda completado por muitos outros
regimes que disciplinavam aspetos de natureza particular ou transitória.
Com
o Decreto-Lei n.º 235/86, de 18 de Agosto (revogado pelo Decreto-Lei n.º
348-A/86 de 16 de Outubro e este ultimo revogado pelo Decreto-Lei n.º 405/93)
iniciou-se o processo tendente a dotar o setor das obras públicas dum enquadramento
jurídico face à adesão de Portugal àquela que é hoje a União Europeia,
nomeadamente face à necessidade de iniciar a transposição para a ordem jurídica
interna de duas diretivas comunitárias: a 71/304/CEE e a 71/307/CEE, ambas de
26 de Julho.
O
código dos contratos públicos entrou em vigor a 30 de Julho de 2008, por
imposição do Decreto-Lei n.º18/2008, de 29 de Janeiro. O CCP encontra-se
dividido em duas grandes partes, já que este é o diploma responsável por
regulamentar a formação e a execução de contratos públicos, de acordo com os
critérios fixados no n.º 6 do artigo 1º CCP.
Denomina-se
fase de formação do contrato o
período que decorre desde a tomada da decisão de contratar até ao momento em
que o contrato é celebrado, sendo que a partir desse momento surge a designada fase da execução do contrato.
O
Código veio efetuar, em primeira linha, a transposição das Diretivas n.º
2004/17/CE e 2004/18/CE, relativas à celebração de contratos públicos de
empreitadas de obras públicas, de locação ou aquisição de bens móveis e
serviços, bem como codificar regras dispersas pelos diversos diplomas que, com
a sua codificação, foram revogados. De entre os diversos diplomas revogados salientam:
· O Decreto-Lei
n.º 59/99, de 2 de Março (que veio suceder ao Decreto-Lei n.º 405/93, de 10
de Dezembro, acima enunciado) - relativo às empreitadas de obras públicas
· O Decreto
– Lei n.º 196/99, de 8 de Junho relativo
à coordenação da aquisição e utilização de tecnologias de informação na
Administração Pública.-
· O Decreto-Lei
n.º 197/99, de 8 de Junho (com
exceção dos artigos 16º a 22º e 29º) matéria relativa à realização de despesas
na Administração Publica.
· O capítulo
III da parte IV do CPA
a sistematização das normas relativas
aos contratos públicos no CCP tinha como principais objetivos:
·
Redução da dispersão legislativa
·
Uniformização e redução dos procedimentos de
contratação pública
· Flexibilização através da consagração de novos
procedimentos ou de novas técnicas de contratação
Princípios da contratação pública
À
contratação pública, enquanto procedimento administrativo, é aplicável a
generalidade dos princípios da actividade administrativa, entre outros, como o princípio
da legalidade, proporcionalidade, imparcialidade e boa-fé.
Destacam-se,
no entanto, três princípios que são especialmente aplicáveis à matéria da
contratação pública, aos quais se deve recorrer aquando da interpretação das
normas do CCP, são eles: o princípio da
transparência, princípio da
igualdade e princípio da
concorrência (n.º4, artigo 1º CCP).
O atual Código dos Contratos Públicos,
desenha uma linha de continuidade relativamente aos principais regimes
jurídicos, em especial, os Decretos--Leis nºs 59/99, de 2 de Março, Decreto197/99,
de 8 de Junho, e 223/2001, de 9 de Agosto, que constituíram a matriz da
contratação pública Portuguesa nos últimos anos, de forma a garantir a segurança
e a estabilidade jurídica aos operadores económicos
O
CCP é assim um documento que interliga os princípios de direito interno com uma
perspetiva de direito mais alargada ao nível do direito europeu, tendo sido,
aliás, por imposição do Direito da União Europeia que a matéria relativa aos
contratos públicos ganhou uma maior consistência e uniformidade, tendo sido
atenuados alguns problemas de divergência das várias disposições legais
aplicáveis a este regime.
Rita Nobre
(n.º
140112032)
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