I. Introdução
O Professor
Freitas do Amaral defende que os regulamentos administrativos são “as normas jurídicas
emanadas no exercício do poder administrativo por um órgão da Administração ou
por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei”. Entende,
por isso, que estes “constituem o nível inferior do ordenamento jurídico
administrativo, uma fonte secundária”. É indiscutível que estes constituem um
elemento da actividade administrativa sem o qual o Estado não funcionaria.
Estes permitem um rápido ajuste normativo de situações específicas que estão em
constante mutação.
O Professor
Freitas do Amaral elenca três elementos essenciais extraídos da noção já
referida:
1.
Elemento
de natureza material
O regulamento
administrativo é composto por normas jurídicas. Estas expressam regras de
conduta da vida social, que, em princípio, são dotadas das características da
generalidade, aplicando-se a uma pluralidade de destinatários, e da
abstracção; aplicando-se a uma pluralidade de situações.
Enquanto comando
abstracto não se esgota, normalmente, numa aplicação, verificar-se-á sempre que
se verificarem as situações que nele se encontram previstas.
2.
Elemento
de natureza orgânica
O regulamento não
é emanado somente por pessoas colectivas públicas integrantes da Administração
Pública. Também as pessoas colectivas públicas não integrantes da Administração,
como o Parlamento. O mesmo se pode dizer em relação a entidades de direito
privado.
3.
Elemento
de natureza funcional
O regulamento é
elaborado nos termos do exercício do poder administrativo. Este aspecto é
sobretudo relevante nos casos em que o órgão não é somente administrativo; como
sucede com o Governo e as Assembleias legislativas regionais, que são
igualmente órgãos políticos e legislativos. Assim, só se trata de um regulamento
administrativo quando estas entidades actuarem ao abrigo das suas atribuições
administrativas.
II.
Espécies de Regulamentos Administrativos
As espécies de
regulamentos podem ser apuradas à luz de quatro
critérios fundamentais:
1.
Relação
entre o Regulamento e a Lei
Regulamentos Complementares ou de Execução: aqueles que desenvolvem ou aprofundam a
disciplina jurídica constante de uma lei, sendo, portanto, ilegais se
contrariarem a lei que desenvolvem. Dentro destes, com base no artigo 112º nº 7
e nº 8 da CRP, distinguem-se:
Regulamentos Espontâneos: aqui a lei nada diz quanto à necessidade
da sua complementarização;
Regulamentos Devidos: é a própria lei que impõe à
Administração a tarefa de desenvolver a previsão do comando legislativo.
Regulamentos Independentes ou Autónomos: regulamentos que os órgãos
administrativos elaboram no exercício da sua competência, para assegurar a realização
das suas atribuições específicas, sem cuidar de desenvolver ou completar
nenhuma lei especial.
Para que o poder
regulamentar exista a Constituição ou a lei assim o têm que prever. Existem
apenas dois casos em que isto não acontece:
Regulamentos Internos: entende-se que os órgãos das
diferentes pessoas colectivas públicas que compõem a Administração têm,
por natureza, este poder, com fundamento no poder de direcção;
Regimentos de Órgãos Colegiais: entende-se que estes têm o poder de
elaborar e aprovar os seus próprios regulamentos de organização e funcionamento,
os regimentos, com fundamento no poder de auto-organização dos órgãos
colegiais.
2.
Objecto
Há que referir,
fundamentalmente, três regulamentos; os de organização, os de funcionamento e
os de polícia.
Regulamento de Organização: são aqueles que procedem à
distribuição das funções pelos vários departamentos e unidades de uma
pessoa colectiva pública, bem como à repartição de tarefas pelos diversos
agentes que aí trabalham.
Regulamentos de Funcionamento: disciplinam a vida quotidiana dos
serviços públicos.
Regulamentos de Polícia: aqueles que impõem limitações à
liberdade individual com vista a evitar que, em consequência da conduta
perigosa dos indivíduos, se produzam danos sociais.
3.
Âmbito
da sua Aplicação
Os regulamentos,
quanto ao seu âmbito podem ser:
Gerais: vigoram em todo o território continental;
Locais: têm o seu domínio de aplicação limitado a uma dada
circunscrição territorial;
Institucionais:
emanam de institutos públicos ou associações públicas, para terem
aplicação apenas às pessoas que se encontram sob a sua jurisdição.
4.
Projecção
da sua Eficácia
Podem se dividir
em regulamentos internos e externos.
Regulamentos Internos: são os que produzem os seus efeitos
jurídicos unicamente no interior da esfera jurídica da pessoa colectiva de
que emanam.
Regulamentos Externos: são aqueles que produzem efeitos
jurídicos em relação a outros sujeitos de direito diferentes, isto é, em
relação a outras pessoas colectivas públicas ou em relação a particulares.
Conforme enuncia
o próprio Professor Freitas do Amaral esta classificação levanta,
fundamentalmente, dois problemas.
1.
O primeiro consiste em saber se os regulamentos institucionais que visam disciplinar
o comportamento dos utentes de um serviço público são regulamentos internos
ou externos. Há quem entenda que são internos por não se dirigirem a todos
os cidadãos em geral, mas a alguns em especial. O Professor Freitas do Amaral
não concorda. Para este são externos pois a sua eficácia não projecta apenas
na esfera jurídica de uma pessoa colectiva pública mas também se produzem
efeitos em relação a pessoas distintas da pessoa colectiva em causa. Os
alunos ou os doentes não são elementos da Administração, mas sim particulares
que usam os seus serviços. Daí que estes regulamentos possam ser, por estes,
impugnados contenciosamente, caso sejam ilegais ou inconstitucionais.
2.
O segundo problema é o de saber se são internos ou externos os regulamentos
que a Administração elabora para disciplinar a actuação dos seus próprios
funcionários. O Professor Freitas do Amaral defende que se determine se se
tratam de regulamentos aplicáveis aos funcionários na sua qualidade de
funcionários, com o fim de disciplinar apenas a organização ou o
funcionamento do serviço, sendo internos; ou se, ao invés, se tratam de
regulamentos aplicáveis aos funcionários na sua qualidade de cidadãos,
sujeitos a uma relação jurídica de emprego com a Administração, com o fim
de disciplinar essa relação e os direitos ou os deveres recíprocos que a
integram, sendo, então externos.
III. Distinção entre Regulamento e Lei
III. Distinção entre Regulamento e Lei
1º critério: diferenciação entre princípios e
pormenores
Lei
caberia a formulação dos princípios;
Regulamento
a disciplina dos pormenores.
No entanto este
é um critério vago.
2º critério: reconhecendo
haver algumas afinidades no plano material entre os dois, distingue-os da
seguinte forma:
Ao regulamento falta a novidade, que é a característica da lei.
Mas este
critério cria o problema dos regulamentos independentes ou autónomos, pois
estes não pressupõem na sua base nenhuma lei.
3º critério: o
da identidade material entre os dois,
que consiste em dizer que distinção
entre ambos só pode ser feita no plano formal e orgânico. Esta distinção apoia-se
na diferente posição hierárquica que ocupam os órgãos de onde emanam e,
consequentemente, do diferente valor formal dos diferentes casos.
O Professor Freitas
do Amaral defende com este último critério.
A nossa
Constituição não fornece qualquer critério de definição entre o domínio
legislativo e o regulamentar. Em cada área normativa deverá haver uma parte
legislativa e uma regulamentar, mas a medida em que isso acontece dependerá da
lei.
À luz do direito
positivo vigente:
É lei todo o acto que provenha de um
órgão com competência legislativa e que assuma a forma de lei, ainda que o
seu alcance seja estritamente individual ou contenha disposições de carácter
regulamentar;
É regulamento todo o acto dimanado de um
órgão com competência regulamentar e que revista a forma de regulamento,
ainda que seja independente ou autónomo e, por conseguinte, inovador.
IV.
Distinção entre Regulamento e Acto Administrativo
Quer o
regulamento quer o acto administrativo são comandos jurídicos unilaterais
emitidos por um órgão competente no exercício de um poder público. O
regulamento, como norma jurídica, é uma regra geral e abstracta, ao passo que
o acto administrativo, como acto jurídico, é uma decisão individual e
concreta.
Na maioria dos
casos a distinção entre estes termos é relativamente fácil, no entanto, há
três casos excepcionais que levam a dificuldades:
1.
Comando relativo a um Órgão Singular
Por exemplo, ao
Presidente da República. É norma jurídica, e não é acto jurídico, se
dispuser em função das características da categoria abstracta e não da
pessoa concreta titular do cargo.
2.
Comando relativo a um grupo restrito de
pessoas, todas determinadas ou determináveis
Por exemplo, a disposição
que promove ao posto imediato todos os actuais funcionários de uma Direcção
Geral. É uma norma jurídica, desde que disponha por meio de categorias
abstractas. Será acto se contiver a lista nominativa dos indivíduos
abrangidos, identificados.
3.
Comando geral dirigido a uma pluralidade
indeterminada de pessoas, mas para ter aplicação imediata numa única
situação concreta.
Por exemplo, a
ordem dada por certa Câmara Municipal aos habitantes de certa povoação para
que hoje, por ter nevado, limpem a sua rua. Grande parte da doutrina considera
haver aqui acto administrativo, mas o Professor Freitas do Amaral pensa que há
norma pois existe a generalidade, o que não há é vigência sucessiva.
Bibliografia consultada: Freitas do Amaral, Diogo; Curso de Direito Administrativo, vol. II, p. 151 e ss.
Francisco Maia Cerqueira (140112098)
Francisco Maia Cerqueira (140112098)
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